A organização não governamental TaxWatch publicou hoje o resultado de um estudo sobre evasão fiscal de sete grandes empresas do ramo da tecnologia: Adobe, Alphabet (dona do Google), Amazon, Apple, Cisco, Meta e Microsoft. Trata-se da prática de organizar arranjos financeiros para que lucros sejam tributados em jurisdições com alíquotas menores e mais favoráveis para as companhias.
Essa artimanha não é, em geral, tipificada como crime. Ela, porém, desagrada vários países que deixam de arrecadar vultosas quantias de impostos corporativos. A Comissão Europeia, por exemplo, já apelou ao judiciário da União Europeia para que a Apple pague impostos alegadamente devidos à República da Irlanda em uma situação que envolve justamente arranjos como o descrito.
A ideia da TaxWatch foi estimar quanto as empresas analisadas pagariam em impostos no Reino Unido caso todo o seu lucro no país fosse tributado lá, considerando uma margem de lucro similar à global. A legislação britânica, contudo, abre margens para que parcelas desse valor sejam tributadas em outros países, na medida em que qual parte do valor foi totalmente gerada no local não é algo tão claro — além de ser flexibilizado ao máximo pelas empresas, para fugir de maiores impostos.
A metodologia usada pela pesquisa consistiu em identificar a margem de lucro das empresas a nível global em 2021, o total de vendas feitas no Reino Unido pelas companhias e, então, aplicar a taxa estimada de lucro a esses dados. Calculou-se, então, a partir da alíquota de impostos corporativos do país, quanto seria o imposto devido, comparando-o ao que foi efetivamente pago.
Os impostos não pagos
No caso da Apple, uma dificuldade adicional foi o fato de a empresa não divulgar oficialmente a sua receita no Reino Unido. A TaxWatch, então, usou dados da Competition and Markets Authority (Autoridade dos Mercados e Competição, órgão antitruste britânico) que estimaram o lucro da empresa no país entre £10 bilhões e £15 bilhões.
A ONG tomou como base a média desses valores (£12,5 bilhões), além de ter estimado a margem de lucro da Maçã em 30%, o que resultou em £3,73 bilhões de lucro. Considerando a alíquota de 19% do país, tal quantia deveria ter resultado em um pagamento de £709 milhões em impostos.
Todavia, a aplicação da taxa sobre os lucros declarados no país da Apple Reino Unido e de suas subsidiárias locais, além da Apple Europa, resultou em apenas £140 milhões. Deixaram de ser pagos, portanto, cerca de £569 milhões.
Ao total, as sete empresas analisadas lucraram juntas no Reino Unido em 2021 quase £15 bilhões, o que deveria implicar em um pagamento de £2,8 bilhões. As companhias, contudo, pagaram apenas £753 milhões. Devido às brechas tributárias e flexibilidades interpretativas, a maior parte dos lucros foi tributada em outros lugares.
Uma forma de fazer a quantia tributável diminuir, por exemplo, é criar justificativas para que partes dos valores sejam tributadas em outros países, como os de origem das empresas. Como ressaltado pelo 9to5Mac, a Apple alega que, sobre o valor de cada iPhone vendido, uma taxa de propriedade intelectual deve ser paga à matriz, o que reduz a margem sob a qual incide a alíquota. É a famosa contabilidade criativa — algo que não é ilegal, diga-se.
A ONG ressaltou que, devido às dificuldades de encontrar os dados com precisão, já que muitos deles não são divulgados, os valores estimados não correspondem com exatidão à realidade, embora a ideia central mantenha-se. Isso abre margem para críticas das empresas quanto à real aplicabilidade da pesquisa.
Como apontou a TaxWatch, o problema está nas legislações que permitem tais brechas, bem como na ausência de algum regulamento internacional sobre taxas unificadas e/ou consistentes, algo que é negociado há algum tempo e tem, inclusive, o apoio da Apple.
Em resposta ao estudo, parte das companhias afirmou pagar os impostos corretamente em todas as jurisdições, o que não é falso. A Maçã, por sua vez, não respondeu aos pedidos da TaxWatch por comentários.