Há exatos 360 dias, escrevi aqui no MacMagazine sobre o plano megalomaníaco da Apple de transportar mais de 4.600 árvores para o seu novo campus — então ainda não conhecido como Apple Park. Quase um ano depois, falei neste artigo sobre uma série de aspectos do projeto faraônico da Maçã, com alguns parágrafos dedicados à vegetação do espaço e à filosofia de Steve Jobs, o pai de toda a ideia original do novo campus, acerca do assunto.
O fato é: as árvores são uma parte crucial do Apple Park, e certamente nós ainda não sabemos tudo sobre elas. Prova disso é esta fascinante entrevista publicada pelo Backchannel com David Muffly, arborista sênior (sim, esse cargo existe) do mais novo campus da Maçã. Na encantadora conversa com o jornalista Steven Levy, Muffly dá mais alguns detalhes sobre a visão de Jobs e revela como ele mesmo foi parar na Apple para este hercúleo trabalho.
Entre Muffly e Jobs, as diferenças eram óbvias a quem olhasse de relance: Muffly é um botânico itinerante cujo solo é o maior dos seus amores, enquanto Jobs era o CEO da empresa mais valiosa do planeta e uma das figuras definidoras de uma geração. Porém, observando com um pouco mais de profundidade, encontravam-se elos entre as histórias dos dois homens; o primeiro deles é que ambos foram hippies durante a juventude, fazendo parte de comunidades alternativas e construindo suas respectivas personas com uma influência implacável deste período de suas vidas.
A Apple comprou tantas árvores num determinado período que causou uma seca no mercado terroso.
Quando Muffly e Jobs se conheceram, em 2010, logo perceberam outra coisa em comum: o amor por árvores. A primeira reunião foi, no maior estilo Jobsiano, não numa sala fechada com luz artificial, mas numa caminhada pelas colinas em volta do campus da Universidade de Stanford — e foi ali que o lendário executivo já percebeu que o botânico pensava nas mesmas linhas que ele mesmo.
Uma coisa levou à outra, e logo Muffly foi nomeado arborista sênior da Apple com uma missão então secreta, mas hoje celebrada por todos: planejar, localizar e plantar as 9.000 árvores, no total, do futuro Apple Park. Um trabalho, digamos assim, de proporções sobre-humanas. Como define o próprio Muffly, falando do dia em que Jobs o levou para uma sala com várias maquetes do novo campus:
Eu fiquei tipo, nossa, isso é louco. Então eu estou olhando para aquilo e meu cérebro está pensando, “é a nave-mãe!”
De acordo com o arborista, foi bem ali que ele compreendeu toda a ideia de Jobs, de transformar o campus em mais do que uma simples área de trabalho — fazer daquele espaço uma declaração. À harmonia, à capacidade de trabalhar em conjunto e, principalmente, à natureza, evocando o ecossistema do Vale do Silício a como ele era antes de as grandes empresas de tecnologia dominarem o local. Este era, e ainda é, o trabalho de Muffly, como define o próprio — e Jobs o ajudou significativamente neste processo.
Como afirma o próprio botânico, o CEO tinha uma noção das árvores melhor dos que muitos arboristas, percebendo apenas com o visual quais tinham uma boa estrutura e seriam boas escolhas para o Apple Park. Juntos definiram que, além de uma infinidade de espécies nativas, seriam plantadas também algumas outras, oriundas de outros territórios, com maior capacidade de absorver a água de possíveis enchentes e regular o solo do campus, evitando inundações. “Como qualquer bom investidor, você precisa diversificar seu portfólio se não sabe o que está vindo pela frente”, define Muffly.
Por fim, o arborista conta alguns detalhes do próprio plano de transporte e plantação das árvores em si, que originalmente totalizaram 6.000 espécimes quando da inauguração do Apple Park; o número acabou saltando para mais de 9.000 quando Muffly percebeu que muitas das árvores pré-existentes no terreno teriam que ser deslocadas e convenceu Jobs a comprar uma fazenda de árvores em Yermo para substituí-las — de fato, a Apple comprou tantas árvores num determinado período que causou uma seca no mercado terroso.
Quanto à pergunta que não quer calar: dentre as centenas de espécies frutíferas presentes no tereno, algumas delas são de macieiras — mas será que eles plantaram pés de maçãs McIntosh1Tipo de Maçã cujo nome inspirou o batismo do Mac. no campus? Bom… segundo Muffly, não:
Não pensei nisso, isso é muito bom. Mas infelizmente Macs não crescem muito bem aqui, então eu tenho meio que uma oposição a elas.
Muito que bem, então. Esperamos que a falta de Macs seja só nas árvores. 😛
via The Loop
Notas de rodapé
- 1Tipo de Maçã cujo nome inspirou o batismo do Mac.