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Bandeira do Brasil

A política de preços da Apple no Brasil não mudou

Uma análise aprofundada sobre todo o cenário de preços da Apple no Brasil

Na última sexta-feira, a Apple confirmou os preços da linha iPhone 12 no Brasil — que vocês, leitores do MacMagazine, já sabiam há algumas semanas. Eles chegarão ao nosso país no dia 20 de novembro.

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Obviamente, com valores estratosféricos que partem de R$7 mil (iPhone 12 mini de 64GB) e podem chegar a R$14 mil (iPhone 12 Pro Max de 512GB), temos, sem muito esforço, mais uma vez o iPhone mais caro do mundo.

iPhones 12

Todavia, apesar desses preços surreais, absolutamente nada mudou na política de preços da Apple no Brasil. E é sobre isso que vou discorrer em uma análise profunda, nos próximos parágrafos.

Que política?

Obviamente, a Apple nem nenhuma empresa revela publicamente detalhes sobre a sua política de preços — seja no Brasil ou em qualquer outro lugar.

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O que sabemos sobre a Apple é que ela opera com margens de lucro folgadas em toda a sua linha de produtos, mundialmente, e isso não teria por que ser diferente no Brasil. Os produtos da Apple são caros em qualquer lugar e, salvas raríssimas exceções, estão sempre brigando dentro do chamado segmento “premium”.

Como não temos como ter acesso aos valores exatos que a operação brasileira da Apple paga para importar cada produto, a base de cálculo que temos é sempre em cima dos valores americanos, em dólar. Isso não quer dizer que a Apple importe um iPhone para o Brasil pagando o preço final de consumidor nos Estados Unidos; essa é apenas a nossa referência de proporcionalidade entre os valores americanos e os brasileiros.

O que sabemos, sim, é que todos os produtos vendidos pela Apple no Brasil são fortemente impactados pela cotação do dólar, que incidem sobre eles uma cascata de impostos que acaba praticamente dobrando seu valor e que há ainda outros custos importantes envolvidos como fretes (internacional e local), seguro (que é altíssimo, no caso do Brasil), taxas de cartões/parcelamento e por aí vai.

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Grosso modo, desde sempre — e provarei isso a seguir —, os preços de produtos da Apple no Brasil podem ser calculados pegando o valor americano, aplicando a cotação média atual do dólar (com uma certa folga/spread, já que ela é bastante volátil) e depois multiplicando isso por dois.

Então a gente paga tudo em dobro?

Mais ou menos.

A conta bruta quando comparamos os valores oficiais é mais ou menos essa, mesmo. Peguemos, por exemplo, os AirPods Pro. Eles custam US$250 nos Estados Unidos e foram, recentemente, reajustados para R$3.000 no Brasil.

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Fazendo a continha acima, US$250 numa cotação do dólar a R$5,80 (acho que estou sendo até conservador, considerando a volatilidade recente da moeda) e depois multiplicado por dois nos leva a, vejam só, R$2.900.

Ou seja, de uma maneira geral, para saber os preços de produtos Apple no Brasil hoje em dia, com o dólar ali variando entre R$5,00 e R$6,00, é só multiplicar o valor americano por 10-12. A conta não fugirá disso.

Mas não, não estamos na prática pagando o dobro do que pagaríamos comprando os produtos nos EUA. Considerando que você já esteja em território americano (obviamente, vamos desconsiderar aqui todos os custos da viagem em si, comparando apenas o quanto você pagaria por um produto Apple lá vs. o preço dele no Brasil), muita gente esquece que não basta simplesmente multiplicar o valor de lá pelo dólar comercial.

Então, novamente, pegando os AirPods Pro como exemplo em uma compra efetuada em Miami: em cima dos US$249 (sem arredondar aqui, para ser bem preciso), incidirão 7% de imposto local, aí sim entra a conversão para o dólar (que um bom cartão de crédito não cobrará menos de 4-5% de spread em cima da cotação comercial — então consideremos aqui uns R$5,70 hoje) e depois mais 6,38% de IOF.

Ou seja, você pagaria hoje não menos que R$1.615 comprando os AirPods Pro nos Estados Unidos. Só que lá você paga à vista, então precisamos comparar também com o valor à vista no Brasil, que tem 10% de desconto — ou seja, R$2.699.

A diferença ainda é brutal, de mais de mil reais nesse caso, mas definitivamente você não conseguiria comprar dois AirPods Pro nos EUA pelo preço de um no Brasil. E isso se aplica a todos os produtos da Apple.

“Ah, mas não é só imposto!”

Há quem ainda insista em repetir, a torto e a direito, que a Apple Brasil tem algum tipo de plano maquiavélico para extorquir especificamente o consumidor brasileiro, aplicando em nosso país uma política de preços que difere de todo o resto do mundo.

Sabe aquela história de “Uma mentira dita mil vezes torna-se verdade”? Então, tem gente que acha que ficar repetindo que o problema dos preços da Apple no Brasil não são impostos vai fazer isso tornar-se realidade.

O fato é que, se você pegar qualquer nota fiscal de um produto vendido pela Apple Brasil, verá que entre 40% e 60%(!) do valor vai diretamente para os cofres do governo.

Nós já mostramos isso duas vezes em posts no nosso Instagram — o primeiro, em dezembro de 2018:

Depois, em junho passado:

Ou seja, não adianta nada ficar negando o fato: num iPhone 12 Pro Max de 512GB que você (não) pagará R$14.000, pelo menos R$5.000 (possivelmente mais) são impostos.

E sim, nós sabemos que há empresas por aí — do setor de tecnologia ou não — que se esforçam bastante para “compensar” essa alta carga tributária brasileira e oferecer preços mais convidativos para o consumidor, seja com fabricação local, negociações/manobras especiais ou pura e simplesmente comprometendo suas margens de lucro para operar no Brasil. Mas a Apple não faz e nem nunca fez isso, ponto.

Aliás, eu arrisco a dizer que a Apple lucra menos vendendo seus produtos no Brasil do que nos EUA.

E não mudou mesmo?

A política da Apple no Brasil? Não. O que mudaram, sim, foram alguns preços nos EUA (o que já era caro ficou ainda mais caro), mas principalmente a cotação do dólar em relação ao real.

Voltemos no tempo.

Dezembro de 2011

No dia 16/12/2011, a Apple Brasil iniciou as vendas do iPhone 4s. O modelo-base, com 16GB de capacidade, chegou ao nosso país por R$2.600. Nos Estados Unidos, ele custava US$650.

O dólar, nessa altura, estava variando entre R$1,68 e R$1,92. Ou seja, o “fator de multiplicação” dessa época estaria em mais ou menos 3,5x — e a proporção no preço do iPhone 4s era de 4x.

Novembro de 2013

No dia 22/11/2013, a Apple Brasil iniciou as vendas do iPhone 5s. O modelo-base, com 16GB de capacidade, chegou por R$2.800. Nos Estados Unidos, ele custava US$650.

O dólar, nessa altura, estava variando entre R$2,15 e R$2,35. Ou seja, o “fator de multiplicação” dessa época estaria em mais ou menos 4,5x — e a proporção no preço do iPhone 5s era, veja só, de 4,3x.

Novembro de 2016

No dia 04/11/2016, redes varejistas parceiras da Apple no Brasil iniciaram a pré-venda dos iPhones 7/7 Plus. O modelo-base, com 32GB de capacidade, chegou por R$3.500. Nos Estados Unidos, ele custava US$650.

O dólar, nessa altura, estava variando entre R$3,15 e R$3,40. Ou seja, o “fator de multiplicação” dessa época estaria em mais ou menos 6x — e a proporção no preço do iPhone 7 era de 5,4x.

Novembro de 2018

No dia 09/11/2018, a Apple Brasil iniciou as vendas dos iPhones XR e XS/XS Max. O modelo-base do XR, com 64GB de capacidade, chegou por R$5.200. Nos Estados Unidos, ele custava US$750.

O dólar, nessa altura, estava variando entre R$3,60 e R$4,00. Ou seja, o “fator de multiplicação” dessa época estaria em mais ou menos 7,5x — e a proporção no preço do iPhone XR era de 6,9x.


Perceberam como o “fator de multiplicação”, tirando pequenas variações (para mais ou menos), não muda?

Ou seja, se o dólar está agora variando de R$5,35 a R$5,80, era esperado que os preços dos iPhones 12 mini, 12, 12 Pro e 12 Pro Max teriam um “multiplicador” de cerca de 11x. Eis a tabela completa oficial:


Modelo/capacidade
Preço no BrasilPreço nos EUAFator de multiplicação
iPhone 12 mini de 64GBR$6.999US$7299,6x
iPhone 12 mini de 128GBR$7.499US$7799,6x
iPhone 12 mini de 256GBR$8.499US$8799,6x
iPhone 12 de 64GBR$7.999US$8299,6x
iPhone 12 de 128GBR$8.499US$8799,6x
iPhone 12 de 256GBR$9.499US$9799,7x
iPhone 12 Pro de 128GBR$9.999US$99910x
iPhone 12 Pro de 256GBR$10.999US$1.09910x
iPhone 12 Pro de 512GBR$12.999US$1.29910x
iPhone 12 Pro Max de 128GBR$10.999US$1.09910x
iPhone 12 Pro Max de 256GBR$11.999US$1.19910x
iPhone 12 Pro Max de 512GBR$13.999US$1.39910x

É até bizarro concluir isso, mas está aí provado que os valores deste ano estão até um pouco abaixo do que poderiam ter sido.

Poder de compra

Mas não adianta muito a gente simplesmente comparar os valores brutos de aparelhos, porque de 2011 para cá, por exemplo, houve muito mais variações econômicas tanto nos EUA quanto no Brasil além de simplesmente os preços tabelados de iPhones e da variação cambial.

Fazer uma análise disso tudo com base no salário mínimo brasileiro certamente está longe de ser o ideal, até porque sabemos que o salário médio no Brasil está acima disso e, principalmente, que há uma desigualdade social imensa em nosso país a qual obviamente coloca o consumidor médio da Apple num patamar bem acima da média geral.

Ainda assim, não deixa de ser uma referência — e vamos usá-la, novamente, em relação aos valores que apresentamos acima:

  • Em 2011, o salário mínimo brasileiro era de R$545. Portanto, para comprar um iPhone 4s de 16GB, o consumidor pagava 4,77 salários.
  • Em 2013, o salário mínimo brasileiro era de R$678. Portanto, para comprar um iPhone 5s de 16GB, o consumidor pagava 4,13 salários.
  • Em 2016, o salário mínimo brasileiro era de R$880. Portanto, para comprar um iPhone 7 de 32GB, o consumidor pagava 3,97 salários.
  • Em 2018, o salário mínimo brasileiro era de R$954. Portanto, para comprar um iPhone XR de 64GB, o consumidor pagava 5,45 salários.
  • Atualmente, o salário mínimo brasileiro é de R$1.045. Portanto, para comprar um iPhone 12 mini de 64GB, o consumidor paga 6,69 salários.

Vale notar que o preço-base dos iPhones flagship subiu bastante nos EUA. Hoje já estamos “acostumados” com certos modelos passando dos US$1.000 (inclusive na concorrência), mas até o lançamento do iPhone X, em 2017, isso era impensável. Em 2016, por exemplo, o modelo mais caro de todos (o iPhone 7 Plus de 256GB) custava US$970; agora, o iPhone 12 Pro Max de 512GB custa US$1.400.

E, com a disparada recente do dólar, isso está impactando mais do que nunca o poder de compra do brasileiro. O iPhone já era considerado muito caro quando estava na casa dos 4 salários; quando chegou aos 7-8 salários, certamente se tornou proibitivo para uma parcela ainda maior de pessoas; agora, então, nem se fala.

Compare, no gráfico a seguir, a evolução do salário mínimo brasileiro de 2011 até hoje, quando comparado com a cotação média do dólar em cada ano:

Fica bem claro, a partir daí, que a oscilação do dólar é grande e que ele superou os reajustes salariais tanto em 2015 quando agora, em 2020 — e, desta vez, o salto foi ainda maior.

Se, em 2011, com um salário mínimo de R$545,00 era possível comprar US$326,35 dólares, atualmente com R$1.045,00 você só consegue comprar US$203,31. A desvalorização da nossa moeda é gigantesca.

Também podemos considerar, ainda, a inflação. Nos EUA ela é bem menor do que no Brasil, mas o iPhone 4s de 16GB, que custava US$650 lá em 2011, equivaleria a cerca de US$760 num valor corrigido para os dias de hoje.

Outra curiosidade bacana é analisarmos como o valor de memória flash vem caindo. Considerando a capacidade interna de alguns dos iPhones supracitados, e com base nos valores em dólar:

  • iPhone 4s de 16GB: US$40,56/gigabyte
  • iPhone 7 de 32GB: US$20,28/gigabyte
  • iPhone XS de 64GB: US$15,60/gigabyte
  • iPhone 12 Pro de 128GB: US$7,80/gigabyte

O melhor custo-benefício atual, nesse sentido, é o do iPhone 12 Pro de 512GB: são US$2,54/gigabyte, apenas.

E quando o dólar baixar?

Observe o gráfico abaixo:

Clique/toque para ampliar | Fonte: TradingView

Ele mostra a cotação do dólar em relação ao real, de 1996 até hoje, e é fácil entender por que muitos consumidores também repetem um mantra mentiroso de que a Apple Brasil não reduz seus preços quando o dólar cai.

Ora, de meados de 2011 para cá, tirando um pico temporário ocorrido no final de 2015, o dólar praticamente só subiu. Ainda assim, temos em nosso histórico de artigos do MacMagazine exemplos de reajustes negativos — incluindo vários ocorridos justamente com essa queda de 2015 para 2016:

Ou seja: sim, se o dólar cair (Deus queira!), podem ter certeza absoluta de que a Apple fará novos reajustes negativos no Brasil.

Não há dúvida nenhuma disso, só não é obviamente algo imediato. A Apple costuma fazer 1-2 reajustes anuais — não é à toa que todos os iPhones ficaram com preços congelados no Brasil por quase um ano, e aí agora vimos subidas tão significativas de uma vez só (chegando a 24,1%, no caso do iPhone 11 de 256GB — mesmo com seu preço tendo sido reduzido nos EUA).

Reação negativa

Sabe outra coisa que não mudou no Brasil, além da política de preços da Apple? A reação negativa de consumidores.

Como nós, humanos, temos memória curta, fomos atrás de alguns tweets desde anos atrás os quais comprovam que os comentários são basicamente sempre os mesmos quando a Apple revela preços de uma nova geração de iPhones superior à anterior — por todos os motivos expostos acima, é claro.

Dezembro de 2011 (iPhone 4s)

Novembro de 2013 (iPhone 5s)

Novembro de 2016 (iPhone 7)

Novembro de 2018 (iPhone XR/XS)

Hoje (iPhone 12)

Conclusão

É inegável que a situação atual de preços da Apple Brasil está pior do que nunca, mas isso é puro reflexo da desvalorização da nossa moeda. Aqui nós demos foco aos iPhones, mas estamos pagando igualmente caro em TVs, videogames, câmeras, eletrodomésticos, carros, vinhos, Nutella, café do Starbucks e por aí vai. Esse impacto é sentido em toda a sociedade.

O fato é que um iPhone 12 hoje por R$7.000 é visto com o mesmíssimo nível de indignação que um iPhone 4s era visto por R$2.600, em 2011. E, tal como naquela época, obviamente vale muito mais a pena comprar um iPhone hoje diretamente nos EUA — você não conseguirá fugir da cotação do dólar, mas pelo menos evita a nossa pesada carga tributária. Isso é verdade hoje e era verdade há uma década.

Pessoalmente, não me recordo da última vez que eu comprei um produto Apple no Brasil — e, se o fiz, deve ter sido por alguma urgência ou quem sabe aproveitando alguma promoção especial que colocou o nosso preço bem próximo do americano. Mas, para muita gente, essa é a única opção; ou era, afinal, esses valores já cruzaram o patamar de viabilidade para bastante gente há anos. Ainda há quem enfrente um parcelamento em 12x, mas isso só serve para suavizar a facada.

Só é preciso entender, de uma vez por todas, que ao mesmo tempo em que a Apple não apertará suas margens de lucro para melhorar “um pouco” os preços de seus produtos no Brasil, ela também não tem nenhum motivo ou intenção de “sacanear” nós, brasileiros. Os preços dela são o que são no mundo inteiro, e nós sentimos um impacto ainda maior devido pura e simplesmente à nossa elevada carga tributária somada ao valor do real em franco declínio.

Sendo assim, só nos resta, mesmo, lamentar — ou, é claro, buscar no mercado alternativas com preços um pouco mais razoáveis. Ao menos essa liberdade todos nós, como consumidores, temos.

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