A terceira semana do julgamento do caso Apple vs. Epic Games começou com a participação de alguns dos principais executivos da Maçã: já falamos aqui sobre o depoimento de Phil Schiller à corte, e hoje foi a vez de mais uma testemunha-chave falar: Craig Federighi, vice-presidente sênior de engenharia de software da empresa.
O depoimento de Federighi girou principalmente em torno de detalhes sobre o funcionamento e segurança do iOS e o investimento da Apple para combater ameaças ao seu ecossistema — tudo, claro, como uma forma de defender o caráter fechado do seu sistema operacional móvel como uma opção mais segura e sólida para usuários.
A declaração mais surpreendente de Federighi veio quando a juíza Yvonne Gonzalez Rogers, responsável pelo caso, trouxe à baila uma das — ditas — maiores incongruências da Apple no quesito: a de que o macOS, um sistema significativamente mais aberto, teria sobrevivido pelos últimos quase 40 anos sem eventos catastróficos de segurança.
Vejam o diálogo, com tradução livre e destaques nossos:
Rogers: O Mac tem múltiplas lojas [de aplicativos]. Então, se isso pode acontecer no Mac, por que vocês não poderiam admitir a existência das mesmas lojas no iPhone?
Federighi: Bom, nós certamente fazemos isso no Mac e esse aspecto é regularmente explorado. O iOS estabeleceu um patamar dramaticamente superior de proteção do usuário. O Mac não está nesse patamar hoje em dia. E eu falo isso apesar do fato de que usuários do Mac naturalmente baixam menos softwares e estão sujeitos a uma base de ataque muito menos motivada economicamente. Se você pegasse as técnicas de segurança do Mac e as aplicasse ao iOS, com todos os seus dispositivos ativos e todo esse valor embutido, a situação ficaria dramaticamente pior do que já está acontecendo no Mac. E eu digo que, hoje, nós temos um nível de malware no Mac que nós não consideramos aceitável e é muito pior do que no iOS. Coloque esse mesmo modelo no iOS e você teria uma situação muito ruim para os nossos usuários.
Para que fique claro, Federighi não falou nenhuma mentira — pelo contrário: é surpreendente, e até desconcertante, ver executivos da Apple falando de maneira tão franca sobre um problema grave de malware e ameaças de segurança. Ele chegou a declarar que alguns membros da sua família tiveram seus Macs infectados com malwares no passado.
O executivo fez ainda um paralelo entre o macOS e o iOS. Segundo ele, o primeiro seria como um carro — isto é, um instrumento que, se operado corretamente, cuidadosamente e seguindo as regras de trânsito, não traria riscos para o usuário, mas pode potencialmente ser destrutivo se utilizado de forma incorreta. O iOS, por outro lado, seria uma ferramenta de livre acesso para todo o público, na qual até mesmo crianças em idade pré-escolar poderiam utilizar seus recursos de forma segura (bom… há controvérsias).
Segundo Federighi, permitir a instalação de aplicativos no iOS por fora da App Store criaria, portanto, um problema de segurança incontornável, já que nenhum sistema de análise humana poderia funcionar com apps assinados e baixados diretamente.
O executivo até tentou arrefecer seus comentários depois, lembrando que o macOS é significativamente mais seguro que o Windows, mas, bom… as declarações já estão dadas.
Fortnite rendeu “mais de US$100 milhões” à Apple
Antes do testemunho de Federighi, quem prestou depoimento à corte foi Michael Schmid, chefe de desenvolvimento de negócios da App Store para a área de jogos. E ele compartilhou uma informação importante: segundo o executivo, a Apple faturou mais de US$100 milhões com as comissões geradas por Fortnite para iPhone ao longo da existência do jogo na plataforma.

Vale notar que Schmid não especificou um valor exato de faturamento: quando perguntado se os números eram superiores a US$200 milhões, ele afirmou que seria inapropriado compartilhar tal informação. Ainda assim, os valores não chegam às estimativas feitas em maio do ano passado pela Sensor Tower — à época, a firma contabilizou que o jogo teria gerado cerca de US$354 milhões à Maçã.
O executivo afirmou, ainda, que a Apple investiu cerca de US$1 milhão no marketing de Fortnite na App Store — isso considerando apenas os 11 últimos meses de disponibilidade do jogo na loja. Em resposta, um dos advogados da Epic afirmou que o valor era um ótimo investimento, considerando os mais de US$100 milhões angariados pela empresa de Cupertino.
Acompanhemos, agora, as cenas dos próximos capítulos: como sabemos, o CEO1Chief executive officer, ou diretor executivo. Tim Cook deverá testemunhar já na sexta-feira (21/5) — e, como ele será um dos últimos depoentes ouvidos, já deveremos seguir para a rodada de considerações finais no início da próxima semana.
Notas de rodapé
- 1Chief executive officer, ou diretor executivo.