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Momento filosófico: Mac vs. DOS, por Umberto Eco

(Antes de mais nada, um pequeno aviso: “We didn’t start the flamewar”, não quero com este post dizer isto ou aquilo contra ninguém, mas apenas exibir um exercício mental neutro que considerei interessante.)

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Umberto EcoEm artigo para a coluna “La bustina di Minerva”, no periódico Espresso, em 30 de setembro, 1994, os fragmentos abaixo refletem a opinião do gênio literário Umberto Eco sobre o conflito ideológico da época entre Mac e DOS.

É um texto delicado, por tocar no barril de pólvora que é a religião, mas ainda assim bastante curioso. A trilha de migalhas de pão que me levou à fonte desta comparação inusitada (um site do GeoCities do século passado!) começou por acaso num artigo do Low End Mac sobre “macarrão com queijo” (outra comparação bem interessante, também, ainda que mais mundana). Veja a tradução do texto em inglês (segunda geração, pois ele já fora traduzido do italiano):

Considerações insuficientes foram dedicadas à nova guerra religiosa subterrânea que vem modificando o mundo moderno. É uma ideia minha antiga, mas descobri que, onde quer que eu fale dela para outras pessoas, todos imediatamente concordam comigo. O fato é que o mundo está dividido entre usuários do computador Macintosh e dos computadores compatíveis com o MS-DOS. Tenho a firme opinião que o Macintosh é católico e o DOS é protestante.

De fato, o Macintosh é contra-reformista e foi influenciado pelo ratio studiorum dos jesuítas. Ele é alegre, amigável, conciliador, diz aos fiéis como proceder passo a passo para alcançar — se não o Reino dos Céus — o momento em que seu documento é impresso. Ele é catequista: a essência da revelação é conseguida com fórmulas simples e ícones suntuosos. Todos têm o direito à salvação.

O DOS é protestante, ou mesmo calvinista. Ele permite livre interpretação da escritura, pede decisões pessoais difíceis, impõe uma hermenêutica sutil ao usuário e assume que nem todos se salvarão. Para fazer o sistema funcionar você tem que interpretar o programa por si: bem distante da comunidade barroca de reveladores, o usuário é confinado dentro da solidão de seu próprio tormento interno.

Você pode contestar, com a passagem para o Windows, que o universo DOS começou a lembrar mais a tolerância contra-reformista do Macintosh. É verdade: o Windows representa uma cisma anglicana, grandes cerimônias na catedral, mas sempre com a possibilidade de se voltar ao DOS e mudar as coisas de acordo com decisões bizarras; no fim das contas, você pode permitir que mulheres e gays sejam ministros, se assim quiser…

E o código das máquinas, que jaz por baixo de ambos os sistemas (ou ambientes, se você preferir)? Ah, isso tem a ver com o Velho Testamento, e é talmúdico e cabalístico…

Curioso, não? Bem no nível de quem escreveu maravilhas como O Nome da Rosa, O Pêndulo de Foucault ou Baudolino (meu favorito: eu o considero uma aula de como mentir contar histórias).

Uma versão maior do texto acima, em inglês (ou uma tradução para o francês), pode ser encontrada nesta página do The Modern Word.

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