Vinícius Resende
Ex-flamingo da Miami Ad School e pós-graduando em Branding pela ESPM, Vinícius se deparou com a Maçã pela primeira vez em 2009. Desde então, a admiração desse paulistano pela marca segue crescendo — às vezes passa um Pano de Polimento de R$200 quando a Apple dá suas escorregadas. Já um verdadeiro apaixonado pelo mercado do entretenimento, paga sua assinatura da Apple TV+ com muito orgulho.
Quando “Ruptura” (“Severance”) estreou no Apple TV+, só não fui correndo conferir por causa de algumas demandas profissionais, porque tudo foi convidativo — Adam Scott (um ator que eu adoro) liderando o elenco, Ben Stiller dirigindo todos os episódios (fiquei curioso, já que nunca assisti a uma série ou um filme com ele por trás das câmeras), uma trama original, para dizer o mínimo do mínimo, e um título intrigante. A estreia me fugiu, mas a recepção do público foi impossível passar despercebida. Que recepção grandiosa!
No Twitter, só se falava de como a nova produção é imperdível e de como a Apple TV+ está “servindo bem para servir sempre”, digamos assim. Realmente estaríamos diante de mais um sucesso numa fila de acertos do streaming da Maçã — vale mencionar que poucas semanas depois, o excelente “Pachinko” chegou ao serviço e nossas primeiras impressões já foram publicadas no MacMagazine. Pois bem, voltando a “Ruptura”: eu decidi esperar pra fazer o famoso binge-watch, então só comecei a assistir depois que o último episódio foi lançado.
E assim eu segui, semana a semana, só acompanhando a aclamação. Mas nada se compara à expectativa do público pro final da temporada; as pessoas estavam literalmente contando as horas. Isso levantou uma bandeirinha vermelha pra mim, porque a expectativa começou a ficar gigante pro meu lado, e aí veio o medo de “Ruptura” não me impressionar tanto depois de colocá-la num pedestal tão alto. Mas este review foi escrito com a música de abertura tocando na minha mente o tempo todo e com um quentinho no coração bem reconfortante. Sim, “Ruptura” merece o pedestal e todos os méritos.
Foi a primeira vez que nem me importei de pesquisar o que a crítica especializada estava achando, porque com certeza também estaria fazendo parte desse movimento de aprovação. Acho que podemos começar comentando o criativo e inteligente roteiro. Para quem ainda não sabe, a série acompanha os colaboradores da Lumon Industries, uma multinacional líder em biotecnologia e responsável pelo polêmico procedimento de ruptura, uma cirurgia consensual que garante o sigilo de tudo o que acontece nos andares dessa firma suspeita.
A cirurgia consiste em implantar um chip no cérebro que impede os funcionários de lembrar o que fizeram durante seu expediente quando saem da empresa. Esse conceito não é de todo mal, certo? Até porque, se você tivesse um trabalho bem chato, esquecer todas as horas trabalhadas salvaria a nação. O problema é que não é um simples esquecimento, já que, para que isso seja possível, a tecnologia do processo de ruptura honra seu nome e rompe a personalidade da pessoa em duas. Enquanto você ainda seria você para curtir a vida, sair com a família, rir com os amigos, etc., sua nova personalidade é que assumiria o controle ao entrar no prédio da contratante durante a semana. Somente na saída é que você voltaria a si, ou seja, você nunca trabalharia de verdade — não reconheceria um colega nem que ele estivesse ao seu lado — enquanto seu outro eu nunca teria uma vida além do serviço.
Eu sempre gostei de histórias sobre transtorno dissociativo de personalidade. Produções como “Motel Bates” e “Fragmentado” são exemplos do meu humilde repertório que exploram muito bem essa dinâmica de diferentes pessoas habitando o mesmo corpo, mas a Apple consegue levar esse tema a um nível completamente novo, trazendo os aspectos de dualidade, desconfianças e guerra interna para um cenário corporativo que você não sabia que precisava conhecer. Só para tentar ilustrar melhor, é como se a série mirasse em “The Office” mas acertasse em “Black Mirror”. Estamos falando de um entretenimento brilhante que traz pontos de vista inéditos e assustadores sobre livre arbítrio e toxicidade no local de trabalho. Agora vem o ponto-chave dessa história: ninguém do carismático quarteto de protagonistas sabe o que realmente faz na empresa, nem mesmo suas próprias “versões trabalhistas”.
Então se você ainda não começou a assistir, prepare-se para ser abduzido por essa jornada em busca de respostas. Logo no começo, a gente conhece o departamento de Refinamento de Macrodados e as atividades diárias do grupo nesse setor, mas elas são tão abstratas e aparentemente sem significado que, se aquilo realmente tiver real impacto para algo ou alguém, os colaboradores podem tanto estar limpando o oceano quanto matando pessoas (até onde eles sabem). As possibilidades dessa colaboração indireta são infinitas e é o mistério que nos prende do começo ao fim. Afinal, para montar um quebra-cabeça de 5.000 peças, é melhor que você goste de montá-lo. Nesse caso, é um deleite. É preciso dizer que, mesmo depois que a temporada termina, apesar de muitas peças ainda estarem faltando, não fiquei frustrado. O roteiro se preocupa em entregar a melhor satisfação possível sem revelar seus maiores segredos, e ver isso em prática foi a coisa mais linda. Sensacional!
Ter Christopher Walken no elenco de coadjuvantes foi perfeito, porque “Ruptura” pedia por esse alguém que pudesse ser uma figura suspeita e ao mesmo tempo criar a química perfeita com John Turturro. Os dois atores desenvolveram um romance tão lindo e profundo e em tão pouco tempo que eles não só conquistam quem está assistindo mas também carregam relevância e peso, principalmente quando esse relacionamento dita uma virada importante na série. Também aproveito pra destacar o desempenho de Patricia Arquette e Britt Lower, duas atrizes fenomenais com muito tempo de tela — pra nossa sorte. Arquette, só com seu olhar, postura e até silêncio, se torna a embaixadora do perigo. O papel de Lower exige uma abordagem bem menos contida, mas igualmente intensa. Ela se torna essa pessoa que está em lugar muito escuro, de muita frustração e medo, e ao mesmo tempo, alguém que luta com unhas, dentes e cérebro.
Sobre Scott, não sei se ele tem mais sucesso fazendo vilões ou mocinhos, só sei que ele sempre entende o briefing, vai lá e faz acontecer. Em “Ruptura”, ele traz inocência e perspicácia nas medidas certas de um protagonista. Não diria que leva a série nas costas porque todas as narrativas paralelas a dele têm um equilíbrio no sentido de serem tão boas quanto, mas Scott consegue representar aquele fio condutor ideal, que une tudo, que só quer fazer a coisa certa para todos e que deve ser a cara dessa produção. São tantos assuntos delicados cercando o personagem dele fora e dentro da Lumon que não tem jeito — a gente se sensibiliza com a história, com a incrível performance de Scott e está do lado dele pro que der e vier.
O gancho pra segunda temporada existe e não tem o menor respeito pela ansiedade dos fãs. Descobrir as consequências de tudo o que aconteceu no último episódio ainda vai levar um tempo, mas com certeza vem coisa boa por aí! E só uma ressalva: o último episódio me incomodou um pouco. Li muitos comentários online e mencionavam sempre a “pura adrenalina”. Na minha percepção, foi o episódio que menos contou com a agilidade dos personagens. Quando existe um corrida contra o relógio, as justificativas para as pessoas não estarem acompanhando essa corrida têm que ser muito boas. Eu não me senti completamente convencido pela falta de senso de urgência do grupo, mas de qualquer forma, a tensão está ali, continuamos no Modo Detetive e a entrega, como falei anteriormente, nunca deixa de satisfazer.
Por fim, é importante mencionar a estética de “Ruptura”. Fotografia é um aspecto no qual a Apple capricha demais e, aqui, não é diferente. Os infinitos corredores e os espaçosos ambientes naquele escritório-labirinto contribuem pra atmosfera solitária. Tudo muito minimalista e familiar, mas ao mesmo tempo adaptado pra própria mitologia sinistra, desde os computadores retrô até o jogo de luzes, cores, quadros, etc.
Todos os nove episódios já estão disponíveis e vão lhe proporcionar uma experiência única, isso é certo. De todo o catálogo da Apple TV+, “Ruptura” é provavelmente meu conteúdo favorito. Além de otimamente produzido, dirigido e roteirizado, é algo verdadeiramente novo e único. É uma série ousada e completa em todos os sentidos. Que venha a próxima temporada!
O Apple TV+ está disponível no app Apple TV em mais de 100 países e regiões, seja em iPhones, iPads, Apple TVs, Macs, smart TVs ou online — além também estar em aparelhos como Roku, Amazon Fire TV, Chromecast com Google TV, consoles PlayStation e Xbox. O serviço custa R$21,90 por mês, com um período de teste gratuito de sete dias. Por tempo limitado, quem comprar e ativar um novo iPhone, iPad, Apple TV, Mac ou iPod touch ganha três meses de Apple TV+. Ele também faz parte do pacote de assinaturas da empresa, o Apple One.
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