O melhor pedaço da Maçã.
Beats Studio Buds

Com os AirPods aí, a Beats ainda tem espaço no mercado?

Quem viveu o fim dos anos 2000 e o início da década de 2010 com certeza se lembra da febre que foram os produtos da Beats by Dre nos primeiros anos de vida da empresa.

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Os seus produtos podiam ser vistos em quase todos os videoclipes da época e eram presença confirmada no cabeça dos principais esportistas do mundo. Afinal, quem não se lembra de ver Neymar Jr. ou o astro do basquete LeBron James usando um headphone bem colorido da marca chegando a um evento?

Esse boom de popularidade, é claro, fez a Beats ganhar uma legião de fãs e… haters também. Apesar do seu estilo diferentão, os produtos da marca nunca foram referência em qualidade de som — fato que sempre foi muito explorado pelo seus críticos.

Isso mudou drasticamente em 2014, quando a marca fundada pela lenda do hip-hop americano Dr. Dre foi adquirida pela Apple pela bagatela de US$3 bilhões — a maior compra da história da gigante de Cupertino até hoje. A Maçã, por sua vez, escolheu manter essa abordagem cool da Beats, mas fez mudanças importantes na tecnologia que embarcava os produtos da sua recém-adquirida subsidiária.

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Com isso, muitos apostaram que a Beats passaria a ser a responsável por desenvolver os fones de sua empresa-mãe. Entretanto, menos de três anos depois, a Apple lançou a primeiríssima geração dos AirPods — o que deixou muita gente confusa.

Não demorou muito tempo até que a Beats também lançasse seus primeiros fones de ouvido sem fio, muitos dos quais contavam com os mesmos recursos das opções oferecidas por sua dona. Mais recentemente, a marca apresentou ao mundo os Beats Studio Buds (que já estão próximos de ganhar uma nova geração) e os Beats Fit Pro, que disputam espaço justamente com o seu irmão maior, os AirPods Pro.

Hoje, a Beats conta com vários dispositivos bastante parecidos com os AirPods e com preços até mais em conta. Mesmo assim, eles ainda parecem longe de superar os dispositivos da Maçã em uma série de quesitos. Considerando isso tudo, por que será que a Apple se importa em manter a marca Beats viva?

Beats by Dre

A Beats foi fundada em 2006, por Dr. Dre e Jimmy Iovine. O primeiro é um dos artistas de maior sucesso do hip-hop mundial, enquanto o segundo é produtor, engenheiro de áudio e cofundador da Interscope Records, além de ser uma figurinha carimbada nos bastidores da indústria fonográfica.

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Para cuidar do design dos seus produtos, a Beats contratou Robert Brunner, fundador da famosa empresa de desenho industrial Ammunition Group. Em uma entrevista à Paste Magazine, em 2014, Brunner disse que a ideia era, desde o começo, apelar para o público mais jovem — coisa que marcas como Bose, Sennheiser e Sony (com exceção do Walkman) nunca conseguiram fazer com seus designs mais “ortodoxos”.

Beats Studio

O primeiro fone de ouvido da marca foi lançado no início de 2008, em parceria com a Monster (não confundir com a marca verde de bebidas energéticas), que ajudou a desenvolver e a produzir praticamente todos os dispositivos da Beats até 2012. Em 2011, a empresa chegou a ter metade das suas ações vendidas para a HTC, que depois vendeu 25% da marca de volta para Dre e Iovine, em 2012.

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Foi nessa primeira fase que a Beats investiu tudo o que pôde em design e marketing, para se estabelecer com um nome forte da hype culture. A ideia da empresa sempre foi ser mais do que apenas uma fabricante de fones de ouvido, e sim uma verdadeira marca de estilo de vida — bem como uma Supreme ou uma BAPE da vida.

Se você acha que a Beats investe pesado para colocar seus fones nos ouvidos de celebridades, saiba que, antes, essa estratégia era feita com ainda mais agressividade. A primeira vez que alguém famoso foi visto usando fones da marca foi em 2008, quando LeBron James apareceu com um Beats Studio de primeira geração na cabeça durante os Jogos Olímpicos de Pequim. Na verdade, Iovine enviou 15 exemplares dos fones para o astro dos basquete que, por sua vez, os distribuiu para todo o time olímpico americano.

5) Após uma reunião com Maverick Carter — antes do lançamento de Beats em 2008 —, Jimmy Iovine enviou a LeBron James 15 pares de fones de ouvido. O resultado? @KingJames deu-os à equipe olímpica dos EUA e, quando eles desceram do avião em Pequim, nasceu o momento do marketing viral.

Essa Beats “raiz” era conhecida, inclusive, por usar cores bem mais saturadas em seus produtos em vez dos atuais tons pastéis. Edições especiais dos fones feitas com a ajuda de outras empresas, por sua vez, já era algo comum e só ajudava a aumentar todo o hype em volta da marca.

Mas o que mais marcou mesmo essa fase da Beats foi o grave característico dos seus fones, considerado exagerado principalmente por audiófilos. Chamado por muitos de “the Beats signature” (algo como “a assinatura Beats”), essa equalização até podia ser interessante para músicas de hip-hop, mas escondia detalhes como vocais e certos instrumentos em outros gêneros musicais.

Essa tal assinatura até está presente nos dispositivos mais recentes da Beats, mas de uma forma bem menos intensa.

Beats by Apple

Depois que foi adquirida pela Apple, a Beats ficou muito mais “comportada”. As cores chamativas deram lugar aos tons pastéis e o material dos produtos ficou bem mais refinado — mesmo que a marca ainda faça algumas colaborações bem espalhafatosas, de vez em quando.

Executivos da Apple e da Beats
Executivos da Apple e da Beats em 1 Infinite Loop

Como dito, a Maçã tratou de lidar com a tal “assinatura Beats”, deixando-a bem menos evidente. Por mais que os fones e caixas de som da marca sigam direcionados ao público fã de hip-hop, está bem claro que a empresa agora se preocupa em torná-los atrativos também para outros tipos de apreciadores de músicas.

A qualidade da construção dos dispositivos também melhorou drasticamente. Se antes era possível sentir, só de segurar um fone da Beats com a mão, que eles eram feitos com um plástico no mínimo barato, a coisa agora está claramente mais refinada. Em uma entrevista de 2019 ao TechRadar, tempos depois da saída de Iovine, o então presidente da marca Luke Wood destacou exatamente isso:

Pensávamos que éramos muito bons até chegarmos à Apple e então começamos a aprender o que realmente era ser “bom” […]. A Apple tem uma disciplina e um rigor incríveis em relação à qualidade do produto.

Algo que se manteve, entretanto, foi o forte investimento da marca em celebridades para promover seus produtos. De vez quando, a Beats até se arrisca para fora do mundo dos esportes/música e traz pessoas como a influenciadora Kim Kardashian para assinar seus produtos — algo que a Apple provavelmente não faria com sua marca principal.

Mesmo assim, é inegável que a Beats está seguindo agora um caminho mais maduro. Se antes ela era apenas uma marca estilosa, agora ela também ostenta certo luxo, bem como os próprios produtos da Maçã.

Fogo amigo?

Como a Beats tem lançado produtos com basicamente os mesmos recursos que os AirPods, é quase natural que nos perguntemos se eles não estão canibalizando as vendas da Apple.

Por mais que esse pensamento possa fazer sentido, gosto de analisar essa situação sob um outro olhar: o de que a Apple usa os fones da Beats justamente para impulsionar a venda dos seus fones, principalmente as dos modelos mais caros.

Para explicar isso melhor, vou usar como exemplo outra linha de produtos da Maçã: o Mac. A essa altura do campeonato, não é segredo para ninguém que a Apple precifica os seus produtos de um jeito bem estratégico, sempre com a intenção de fazer você comprar a versão mais cara de um dispositivo — e isso, é claro, acontece com os Macs.

Nos voltemos para o MacBook Air (com chip M2), por exemplo. Se você entrar agora no site da Apple e configurá-lo com o chip mais poderoso disponível, 16GB de memória e 512GB de SSD, você estará diante de um computador de nada menos do que US$1.700 — a “apenas” US$300 de distância do pomposo MacBook Pro de 14 polegadas com o chip M2 Pro (também com 16GB de memória e 512GB de espaço).

Essa proximidade no preço definitivamente não é uma coincidência. A ideia, aqui, é seduzir o comprador a gastar “só” mais US$300 para pegar o notebook mais caro e poderoso. Se você levar em conta os MacBooks recondicionados pela Apple e as promoções do varejo, isso fica ainda mais dramático. E entre os fones da Beats/Apple, isso não é diferente.

Os Beats Fit Pro, por exemplo, custam US$200 (ou R$2.150, no Brasil) e contam com basicamente todos os recursos oferecidos pelos AirPods Pro (Cancelamento Ativo de Ruído, modo Ambiente, troca automática entre dispositivos, etc.), de US$250 (ou R$2.600). Mas, quando analisamos os dois modelos de perto, vemos que os AirPods Pro são melhores em praticamente todos os quesitos, nem que seja por uma pequena margem.

Observe: os Beats Fit Pro são equipados com o chip H1, enquanto os AirPods Pro ostentam o mais recente H2. Os Beats Fit Pro funcionam com a rede Buscar (Find My), enquanto os AirPods Pro, além disso, também trazem o chip U1 para habilitar a chamada Busca Precisa. A case dos Beats Fit Pro pode ser recarregada via cabo, enquanto a dos AirPods Pro funciona também com carregadores sem fio, MagSafe e com o carregador do Apple Watch. E por aí vai…

AirPods para fashionistas

Ser adquirida pela Apple fez a Beats enveredar ainda mais para o mundo fashion. Se antes os acessórios da marca já eram tratados como verdadeiros itens de vestuário, agora eles alçaram ao nível de itens de streetwear.

Isso pode ser conferido nas incontáveis colaborações da subsidiária com marcas do ramo, tal como a FRAGMENT e a Union Clothing, além de outras parcerias com artistas intimamente ligados com o mundo da moda, como o japonês Verdy e a americana Melody Ehsani.

Por mais que os AirPods tenham um quê de item fashion (principalmente os AirPods Max), é verdade que eles não chegam nem perto de ter a mesma variedade que os fones da Beats têm. O máximo que uma pessoa pode fazer para dar uma cara diferente aos seus AirPods é comprar uma case de proteção diferentona ou optar por um estojo de carregamento personalizado, por exemplo.

Os fones da Beats, por sua vez, existem para preencher esse espaço. Como eles não possuem o mesmo alcance que os fones da Maçã, fica mais fácil lançar versões dos acessórios com cores mais espalhafatosas. Ademais, isso também protege os AirPods de uma possível “saturação”.

Boa parte dessas colaborações são extremamente limitadas, o que torna os produtos verdadeiros itens de colecionador que são vendidos por preços estonteantes na internet afora. Os Beats Flex feitos em pareceria com Verdy para o seu projeto Girls Don’t Cry, por exemplo, foram lançados por US$70, mas podem ser encontrados hoje por nada menos do que US$208 em sites como a StockX, por exemplo — muito conhecida no mundo da hype culture.

Afinal, tem espaço ou não tem?

Sim, tem. A existência da Beats cumpre um papel inegavelmente estratégico para a Apple. Ao mesmo tempo em que ela atende um público que não está a fim de gastar tanto assim em um acessório, ela também serve como uma marca experimental que pode ser usada para collabs e coisas parecidas.

Isso somado ao fato de que, de certa forma, os fones da Beats ajudam a impulsionar as vendas dos AirPods, cria uma relação simbiótica entre a marca e a Apple. No final, a Apple sempre ganha, não importa qual modelo o consumidor decide comprar.

Por mais que a Beats viva hoje na sombra da Apple, ela ainda é um nome muito forte no mercado de acessórios de áudio. Segundo informações da Statista, a Beats fechou o ano de 2022, por exemplo, como a segunda marca de fones de ouvido mais popular dos Estados Unidos, com um market share de 16% — três pontos percentuais a mais que a Bose. A Apple, é claro, aparece em primeiro, com confortáveis 37%.

O hype em torno da Beats pode ter caído bastante de 2008 para cá, mas ele certamente ainda existe. A marca claramente tem um grande apelo com o público jovem, o que a torna uma porta de entrada para o ecossistema da gigante de Cupertino. Como alguns produtos da Beats vêm com um período de testes grátis do Apple Music, é bem possível alguém acabe assinando o serviço e, quem sabe, comprando outros produtos da marca no futuro.

Em outras palavras, enquanto a Beats continuar cool, ela sempre vai ter espaço no mercado e na linha de produtos da Apple.

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