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Crítica: “The Beanie Bubble” segue onda das “buypics” com comédia charmosa, mas pouco memorável

Você já ouviu falar em “buypics”? Provavelmente não, porque eu acabei de inventar o termo, mas o trocadilho com “biopics” serve para designar um tipo de filme que parece estar em alta no cinema em 2023: as histórias baseadas em acontecimentos reais que relatam algum capítulo — que pode bastante conhecido ou deveras obscuro — dos estágios mais recentes do capitalismo estadunidense, geralmente focando em alguma marca ou produto icônico das últimas décadas.

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Apenas nos últimos meses, tivemos o lançamento de “AIR – A História por Trás do Logo” (sobre o Air Jordan), “BlackBerry” (sobre os famosos smartphones brutalmente assassinados pelo iPhone), “Flamin’ Hot: O Sabor que Mudou a História” (sobre… um sabor de Doritos?) e, no próprio Apple TV+, “Tetris” (de nome autoexplicativo).

Até mesmo o fenômeno “Barbie” pode ser encaixado nessa turma, de certa forma: são filmes que ensaiam uma crítica ao sistema examinando suas entranhas mais esquisitas, e tentam se equilibrar em uma corda-bamba entre a subversividade e a reverência àquilo que está sendo retratado — na maioria das vezes (e em detrimento próprio) pendendo demais para o lado da celebração. São sátiras ao tal do “sonho americano” (seja lá o que ele signifique) que, de certa forma, acabam contribuindo para idealizá-lo.

“The Beanie Bubble – O Fenômeno das Pelúcias”, que estreou anteontem no Apple TV+, é mais uma entrada na lista. Desta vez, o foco se volta aos bonecos de pelúcia Beanie Babies, que, embora não muito conhecidos nas partes de cá do planeta, se tornaram uma verdadeira febre nos Estados Unidos na segunda metade da década de 1990 — a ponto de que, em um determinado momento, passaram a ser colecionados não apenas como brinquedos, mas até mesmo como investimentos financeiros.

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A narrativa, como era de se esperar, centra-se em Ty Warner (Zach Galifianakis), o empresário que criou os tais dos Beanie Babies nos anos 1980 e, por meio de uma estratégia que envolveu ações de escassez artificial e uma ajudinha nada sutil do boom da internet, tornou-se um dos maiores bilionários dos Estados Unidos em menos de duas décadas.

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Ao optar por uma estrutura não-linear, que vai e volta entre o início da jornada de Warner e a sua vida após a conquista do mundo dos brinquedos, “The Beanie Bubble” consegue injetar no seu ritmo uma vivacidade notável, mas por vezes em detrimento do próprio desenvolvimento narrativo: os vai-e-vens no tempo acabam apressando algumas situações e impedindo um destrinchamento mais cuidadoso das motivações dos personagens, dando uma impressão geral de fugacidade.

Talvez a maior culpada aqui seja a edição, porque o roteiro de Kristin Gore, baseado no livro de Zac Bissonette, é realmente afiado. Isso não chega a ser nenhuma surpresa, considerando que a roteirista  tem ampla experiência televisiva em produções como “Futurama” e “Saturday Night Live”, conhecidas justamente pela sua acidez e pelo ritmo um tanto quanto frenético.

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É claro que não estamos falando aqui de uma grande obra escrita — o roteiro de “The Beanie Bubble” nunca consegue escapar da tendência de infantilização que tem arrebatado Hollywood, jogando qualquer tipo de subtexto pelos ares e apostando apenas no texto, isto é, naquilo que é facilmente compreensível e processável pelas camadas mais básicas de interpretação. Pelo menos, a boa notícia é que o texto é bom.

Gore (que vem a ser filha de Al Gore) dirige o filme junto a seu marido, Damian Kulash, Jr. (que vem a ser o vocalista e frontman da banda OK Go). Esta é a primeira vez do casal na cadeira da direção, mas a inexperiência não salta aos olhos: embora filmada de maneira quase impessoal, sem grandes toques autorais ou desvios do “padrão biopic de 2023″, a produção tem personalidade o suficiente para apresentar Warner como uma figura deveras questionável, mas que nunca perde a humanidade.

Kristin Gore e Damian Kulash, Jr, diretores de “The Beanie Bubble”

Falando nisso, Galifianakis (sinceramente perturbador sem sua característica barba) prova mais uma vez suas credenciais fora da comédia: embora “The Beanie Bubble” tenha uma boa dose de humor, o ator — mundialmente conhecido por sua performance escandalosamente engraçada na trilogia “Se Beber, Não Case” — brilha aqui mesmo é nos momentos mais sutis, quando derruba o verniz de self-made man do seu personagem para exibir uma vulnerabilidade genuína, quase (quase) comovente.

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Apesar disso, não seria injusto dizer que “The Beanie Bubble” pertence às mulheres — três mulheres, especificamente: Robbie (Elizabeth Banks), Sheila (Sarah Snook) e Maya (Geraldine Viswanathan). As duas primeiras são parceiras de Warner em algum ponto da sua vida, enquanto a terceira é uma jovem brilhante contratada pelo empresário, crucial para o sucesso da empreitada. Em comum, elas são instrumentais para a ascensão meteórica dos famigerados bonecos de pelúcia (porém nem tanto para colher os louros da vitória), o que dá à narrativa algumas tinturas feministas bem-vindas, porém pouco sutis.

Ty (Zach Galifianakis) e Maya (Geraldine Viswanathan) em “The Beanie Bubble”

Do trio feminino, Banks — que estava fazendo falta na frente das câmeras desde a sua incursão como diretora em filmes como “O Urso do Pó Branco” — é a que se mais se destaca, com um papel que exercita seus músculos de comediante ao mesmo tempo em que evoca performances mais melancólicas da atriz, como em “Beach Boys: Uma História de Sucesso”. Robbie consegue ser parceira e nêmese de Warner em iguais proporções, e uma atriz menos capaz poderia facilmente cair num maniqueísmo estereotípico. Banks, não.

Snook, recém-saída do fenômeno “Succession”, habita uma personagem completamente diferente de Shiv Roy e prova sua versatilidade: Sheila é a âncora de humanidade do filme e, ainda que Snook apareça menos do que deveria (mais uma vez, culpa da edição indecisa e excessivamente acelerada), ela consegue estabelecer uma parceria magnética em cena com Galifianakis. 

Viswanathan, por sua vez, prova de novo que é uma das atrizes em ascensão mais promissoras de Hollywood (se você não está associando o nome à pessoa, ela foi a protagonista de “Hala”, um dos primeiros filmes do Apple TV+): Maya é energética, carismática e encantadora — mérito de uma performance sensível e segura da jovem atriz australiana.

Como tem se tornado praxe, as escolhas musicais de “The Beanie Bubble” — que passam por The Cure, Queen, INXS, Cranberries e companhia bela — fazem de tudo para colocar o espectador no clima da época, mas sem grande criatividade: é tudo uma grande jukebox com alguns dos maiores sucessos dos anos 1980/90, por vezes sem grandes conexões com o que está sendo visto em tela (sério, o que diabo “Plainsong” tem a ver com aquela cena inicial?). Pelo menos temos aqui também uma canção original competente do OK Go, intitulada “This”.

Sheila (Sarah Snook) em “The Beanie Bubble”

Em termos visuais, é bem verdade que me parece uma oportunidade perdida fazer um filme sobre brinquedos multicoloridos tão visualmente sóbrio, mas a escolha é compreensível — quem não se lembra, afinal, do universo de beges e brancos da segunda metade dos anos 1990?

No fim das contas, “The Beanie Bubble” revela, de maneira mais ou menos divertida, o lado menos conhecido de uma história que certamente vai apelar aos corações mais nostálgicos. Mas devo avisar que você provavelmente já vai ter esquecido da história — e do filme como um todo — alguns dias depois.

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