Como alguém que gosta muito de tecnologia, eu ocasionalmente me empolgo com ideias inovadoras que acabam fracassando. Alguns exemplos recentes foram os Snap Spectacles (que seguem vivos), o LG Wing e o Essential Gem.
Apesar de terem falhado, esses são alguns dos meus produtos favoritos dos últimos anos por um simples motivo: eles assumiram um risco e tentaram algo diferente.
No caso da Samsung, vejo um pouco disso com a linha Galaxy Z. Apesar de eu ainda achar que toda esta categoria é um interessante exercício tecnológico para resolver um problema que ninguém tem, a Samsung segue atualizando os dispositivos, eliminando anualmente seus principais problemas. Escrevi sobre isso recentemente nesse artigo.
E no caso da Apple? Seria fácil dizer que o Vision Pro é esse produto inovador e potencialmente cretino. Mas, na realidade, existe outro produto ocupando este espaço, insistindo há quase dez anos que é o futuro. Falo, é claro, do iPad Pro.
Após seu lançamento em 2015, eu comprei 100% a ideia de trabalhar apenas no iPad Pro. Aposentei meu Mac, comprei o Smart Keyboard, adaptadores, o Apple Pencil, mais adaptadores e mergulhei no mundo da automação com o Workflow (hoje, Atalhos), IFTTT, Zapier e congêneres para contornar as limitações do iOS que me impediam de trabalhar em um iPad feito para… se trabalhar.
Mais do que isso, preguei a palavra do estilo de vida iPadístico com a mesma obstinação que os fãs de Elon Musk dilapidam atualmente para defender a sentina que o Twitter se tornou. Quando alguém criticava o iPad, eu me sentia atacado. Refutava. “Como assim não dá para trabalhar de verdade no iPad? Eu sou a prova de que dá, sim! Ele é diferente do jeito de se trabalhar no Mac porque ele é o futuro!”
Por uns três anos, até que deu certo. Mas quer saber? A verdade é que trabalhar no iPad Pro dava um trabalho danado. Acabei voltando para o MacBook Pro em 2018 e nunca mais olhei para trás. Foi quando eu entendi as críticas dos usuários de Mac, que viviam dizendo que agora a Apple só tinha olhos para o iPad. No mundo do Mac, quase nada havia mudado em três anos.
Os idos de 2018 foram uma época interessante. De um lado, a Apple ainda proclamava que o iPad Pro era o futuro da computação pessoal. Do outro, ela tentava aplacar a preocupação da turma do Mac que, justificadamente, se via abandonada. Estávamos no auge da polêmica do teclado borboleta e a maior novidade dos últimos anos havia sido, ironicamente, a Touch Bar. (E o comercial “What’s a Computer?” definitivamente não ajudou.)
Vale lembrar que esse também foi uma espécie de período das trevas na relação entre a Apple e a Intel, quando os atrasos na evolução dos processadores atrapalharam bastante o calendário de lançamentos de Macs. É natural que a Apple visse no iPad Pro a esperança de um mercado com potencial inexplorado e rentável.
O problema é que o iPad Pro falhou em uma missão secundária: despertar o interesse do grande público para o resto da linha de iPads. Por conta disso, a Apple gradualmente foi abrindo mão de funcionalidades e compatibilidades exclusivas do iPad Pro, e as trouxe para o resto da linha. Hoje, todos os iPads são compatíveis com o Apple Pencil (ainda que um deles de uma maneira muito estranha). Muitos têm teclados com trackpad feitos pela própria Apple. O iPad Air, inexplicavelmente, tem um chip M1. Até mesmo os recém-lançados Logic Pro e Final Cut Pro para iPad não são exclusivos do modelo Pro.
Mas, nem assim, o iPad vingou. Na semana passada, a Apple revelou os resultados financeiros do terceiro trimestre fiscal de 2023. Dos US$81,8 bilhões faturados, US$5,8 bilhões vieram de iPads. Bastante, certo? Não exatamente.
Em 26 de julho de 2016, ou seja, quando o iPad Pro já estava disponível nas versões de 9,7 e 12,9 polegadas, ela divulgou os resultados financeiros referentes ao terceiro trimestre fiscal daquele ano. Dos US$42,4 bilhões faturados na época, US$5 bilhões vieram de iPads.
Isso quer dizer que, enquanto o faturamento da Apple cresceu 92% entre 2015 e 2023, o faturamento dos iPads aumentou apenas 15% neste mesmo período. Mais do que isso, a representatividade do iPad no faturamento total da empresa caiu quase pela metade.
Pois bem. Neste meio-tempo, a Apple deu o braço a torcer. No fim das contas, o futuro da computação pessoal não era o iPad, mas sim o Mac. Ela voltou a investir na linha, apresentou o Apple Silicon, devolveu as portas e conectividades que o Jony Ive havia tirado, e o público respondeu. Após anos de demanda represada, a recompensa veio na forma de um aumento de faturamento que chegou a 70% no segundo trimestre fiscal de 2021.
Acho que não é exatamente uma afirmação polêmica dizer que o iPad e, especialmente o iPad Pro, nunca realmente emplacaram como a Apple pretendia. Mais do que isso, a empresa passou os últimos anos depenando as vantagens exclusivas do iPad Pro, mas ainda assim toda a linha de iPads parece apenas lutar para manter a cabeça acima do nível da água. É bem verdade que o iPad Pro é o modelo mais popular dos EUA, mas essa não é exatamente uma barra muito alta.
Em meio a essas manobras, o pouco motivo que o iPad Pro tinha para existir parece ter desaparecido. Tirando a tela maior, as outras diferenciações dele em relação ao iPad Air, por exemplo, são coisas que o tempo deve resolver (ProMotion, câmera ultra-angular, Face ID, Thunderbolt, Wi-Fi 6E, etc.).
E falando em tela maior, havia um tal iPad Pro de 14,1″ e/ou 16″ que virou rumor em 2021, poderia ser lançado no início de 2023, passou a ser previsto para mais tarde, corre o risco de nunca ver a luz do dia, ou talvez não seja nem Pro.
Agora, se esse iPad maior for lançado, e não for um modelo Pro, já sabe… né?
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