O melhor pedaço da Maçã.

“Flora and Son” é um conto comovente e bem-humorado sobre música, desejo e família

Fazer um filme musical é uma coisa. Outra, completamente diferente, é ter um entendimento tão completo — e complexo — do ato de fazer e escutar música que seu filme exala melodia em todos os seus momentos, mesmo aqueles em completo silêncio.

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John Carney é um diretor que sempre pertenceu ao segundo grupo. Desde “Apenas Uma Vez”, filme de 2007 que faturou o Oscar de Melhor Canção Original (por “Falling Slowly”) e o colocou no mapa dos cinéfilos do mundo inteiro, o cineasta vem construindo uma filmografia que traz o poder da música no seu âmago, mesmo em produções que não podem ser consideradas musicais, digamos, puro-sangue.

John Carney.

Junte isso a uma série de outras marcas registradas do diretor — o realismo humanista, os retratos honestos e compassivos de pessoas da classe trabalhadora, o foco nas relações afetivas e um ar muito, muito irlandês — e você tem “Flora and Son” (ou, em bom português, “Flora e Filho – Música em Família”), mais novo filme de Carney, que estreou no Apple TV+ na última sexta-feira após uma exibição muito bem-sucedida no último Festival de Sundance.

A história gira em torno de Flora (Eve Hewson), uma jovem mãe solteira de trinta e poucos anos que trabalha como babá para pagar as contas e precisa lidar com Max (Orén Kinlan), seu filho de 14 anos que caminha na corda-bamba do talento musical e da delinquência juvenil. Nas periferias de Dublin onde o filme se desenrola, somos apresentados também a Ian (Jack Reynor), pai de Max, outrora um baixista de algum sucesso que abandonou a carreira e vive uma vida um pouco mais confortável com o dinheiro da nova namorada.

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Com o objetivo de afastar Max das más influências das ruas, Flora resgata um violão velho do lixo e dá o instrumento, já devidamente restaurado, de presente para o filho. Mas o lance de Max é outro — as batidas, os loops e mixes da música eletrônica, mais precisamente —, então a própria Flora resgata sua veia musical há muito adormecida e resolve aprender a tocar, ela mesma, o violão.

Para isso, ela contrata Jeff (Joseph Gordon-Levitt), um músico frustrado e professor ligeiramente pomposo da Califórnia que, em uma série de aulas mediadas por uma tela de computador, mostra a Flora o poder da música na expressão de sentimentos há muito reprimidos. Dessa relação, como você poderia esperar, floresce algo a mais — mas estaria Flora realmente apaixonada por Jeff ou simplesmente pela promessa de libertação trazida por aquele homem, que vive um cenário tão diferente daquele em que ela vive?

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Pela descrição acima, fica claro que Carney não está explorando nenhum terreno exatamente inédito na sua filmografia (OK, com alguma boa vontade, a inclusão da house music como elemento narrativo pode ser considerada uma inovação, levando em conta a preferência do diretor pelo folk e pelo pop romântico). Mas não é como se alguém tivesse pedido para o cineasta inovar, mesmo: é no romance, na temática musical e na Irlanda que ele se sente mais confortável para expressar seus contos mais sinceros e íntimos (basta ver que “Mesmo Se Nada Der Certo”, ambientado nos Estados Unidos, é o filme, digamos, menos melhor de Carney).

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“Flora and Son” não é diferente: não espere encontrar aqui uma trama elaborada ou cenas grandiosas de grandes gestos apaixonados. Em vez disso, o que temos é um olhar franco, nem um pouco julgador e muitas vezes bem-humorado sobre pessoas perfeitamente normais, daquelas que você certamente encontra dobrando qualquer esquina menos abastada de Dublin ou qualquer outra grande cidade do mundo. A construção do microcosmo do filme é o seu grande triunfo — tanto é que, ao fim dos seus econômicos 97 minutos, você deseja poder passar muito mais tempo com aqueles personagens.

Para além de Carney, grande parte do mérito aqui vai para Hewson, que encara sua primeira protagonista com a segurança de uma veterana. Ela — que, filha de Bono, certamente já carrega a música em seu DNA desde a concepção — imprime à sua personagem uma faceta completamente identificável, falha nas suas humanidades, sem nunca apelar para os estereótipos ou as dicotomias. Flora guarda dentro de si doses enormes de solidão, desencantamento e tesão, mas é também vívida, esperançosa e solar.

Só mesmo uma performance cheia de nuances, como a de Hewson, nos faz “comprar” a relação complexa da personagem com o filho — e palmas aqui também para o roteiro de Carney, que se recusa a romantizar a experiência da maternidade e consegue incluir uma fala tão inquietante quanto “às vezes eu gostaria que ele sumisse” sem fazer com que percamos a simpatia por aquela mãe. Flora é uma bagunça e os caminhos que o filme encontra para organizar um pouco daquela vida (notadamente, a música e as relações) nunca são os mais previsíveis ou os mais fáceis.

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A propósito, se eu ganhasse um centavo a cada filme da Apple ou sobre a Apple que inclui uma cena importante e catártica ao som de “Both Sides, Now”, eu teria três centavos — o que é pouco, mas é bem curioso que isso já tenha acontecido três vezes. Bom, pelo menos o espírito de Steve Jobs está feliz que algum dinheiro do cofrinho infinito da Maçã está caindo na conta de Joni Mitchell.

Naturalmente, “Flora and Son” não é perfeito: o desfecho do conflito principal, por exemplo, parece um tanto corrido ou menos desenvolvido do que poderia ser, para um filme que gosta tanto de se demorar nos sentimentos e nas ações dos seus personagens. Além disso (impossível não citar isso num site como o MacMagazine), uma cena inteira de dois minutos soa como uma propaganda descarada do GarageBand — sim, eu sei que o filme foi adquirido pela Apple já basicamente pronto e o “papel” do software na trama é muito provavelmente uma coincidência, mas ainda assim, não pegou bem.

Ainda assim, pequenas falhas não desabonam um conjunto tão sincero e comovente, daqueles que certamente estamparão um sorriso no seu rosto ao final da produção — e, ainda por cima, instalarão a música original “High Life” de maneira basicamente irreversível no seu cérebro. Aconteceu comigo. 😛

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