Se tem uma coisa que gera muita discussão no mundo Apple é a questão envolvendo impostos. Para muitos, esse é o principal responsável pelos preços exorbitantes praticados pela empresa no Brasil; para outros, a ganância da Apple (ou seja, sua margem de lucro e sua “conversão descabida” de dólar para real) é o grande vilão dessa equação.
Em um post recente, o MacMagazine mostrou que, apesar de os valores dos novos iPhones estarem num patamar altíssimo, tudo basicamente sempre foi assim no Brasil. E, é claro, o artigo gerou polêmica e muita discussão.
Um dos comentários mais bem avaliados daquele artigo, feito pelo leitor Igor Flores, dizia:
Recomendo ao site buscar um tributarista para auxílio nos próximos artigos. Está bem escrito e faz sentido. Porém, os impostos incidem sobre o preço de venda, por fora ou por dentro (ICMS). A nota fiscal faz uma apuração aproximada deste custo baseado no valor de NF para que seja fácil ao consumidor ter uma ideia. Porém, a Apple não importa os aparelhos com preço de loja, e não me canso de ver isso aqui. Provável que estes iPhones devem chegar aqui por metade do valor em dólares vendidos lá fora, ou seja: a margem é gigantesca e isso é provado através dos resultados financeiros todo trimestre.
Acho legal a ideia do artigo. Mas são apenas comparações leigas bem embasadas. Vocês não conseguem acesso ao preço de invoice da Apple Brasil? Ou então na RFB para ver o valor de desembaraço.
Exemplo prático final: preço de venda R$14 mil, tributos de 40% = R$5.600. CMV (Custo de mercadoria), R$3 mil, resultado líquido: R$5.400 por aparelho.
Como eu sou contador e trabalho nesse mundo envolto de números, leis e impostos — e já fui colaborador do MacMagazine no passado —, o site me procurou para ajudar a esclarecer esse ponto. E aqui estou.
Os valores dos impostos nas notas fiscais
A Lei 12.741/2012 exige, desde 2013, que todas as notas fiscais emitidas no Brasil para consumidores finais possuam o destaque da carga tributária que está sendo paga em toda a cadeia produtiva, da fabricação até a venda ao consumidor final.
Para se calcular esses tributos, são levados em consideração diversos fatores, sendo um dos principais o código NCM (sigla para Nomenclatura Comum do Mercosul).
Empresas grandes, como a Apple, são capazes de desenvolver seu próprio estudo tributário para cumprimento dessa lei; porém, pequenas empresas não dispõem de mão de obra para manter esses estudos atualizados constantemente, visto que a legislação tributária brasileira muda frequentemente.
A fim de facilitar esse trabalho, o IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário), órgão composto por diversas empresas privadas e que atua realizando estudos tributários no Brasil, criou uma tabela baseada no código NCM que pode ser adicionada aos sistemas de emissão de notas fiscais — para que se cumpra essa obrigatoriedade legal.
Essa tabela reúne os quase 12.000 códigos NCM existentes e apresenta as alíquotas federais (IRPJ, CSLL, PIS e COFINS), estadual (ICMS) e municipal (ISS) que são cobradas naquela categoria de produtos em uma média de todos os regimes tributários existentes no Brasil.
Por ser a tabela mais utilizada atualmente no mercado — e por sua fidedignidade à legislação brasileira —, ela será utilizada para prosseguirmos com alguns cálculos.
Impostos do iPhone
O NCM do iPhone, assim como de outros aparelhos celulares, é o código 8517.12.31. Segundo a tabela do IBPT, a alíquota estimada dos impostos sobre esse tipo de produto é:
- 8,37% para os impostos federais nacionais;
- 14,78% sobre impostos federais referentes a importação;
- 17% para os impostos estaduais.
Desta forma, temos uma carga tributária total de 40,15%, muito próxima dos valores apresentados nas notas fiscais emitidas pela Apple. Segundo essa alíquota, dos R$7.999 que pagamos por um iPhone 12, aproximadamente R$3.200 são referentes a impostos.
O grande problema de utilizarmos o cálculo do iPhone é que alguns modelos podem ser fabricados no Brasil, o que acabaria por diminuir essa carga tributária. Isso ainda não acontece com os iPhones 12, mas modelos como os iPhones SE e o 11, por exemplo, já são montados no Brasil.
Impostos do MacBook Pro
Para não ficarmos com o cálculo de apenas um produto, vamos dar uma olhada também nos MacBooks. Tomaremos como o exemplo uma nota fiscal do MacBook Pro de 16 polegadas (modelo de entrada).
Nela, o valor final do produto é de R$27.269,10 e apresenta a informação de que temos impostos federais de R$6.972,18 e estaduais de R$5.453,82, totalizando R$12.426,00 de carga tributária destacada em nota.
Seguindo a mesma lógica do cálculo do imposto no iPhone, temos o MacBook Pro sendo tributado pelo NCM 8471.30.19, nas seguintes alíquotas:
- 11,9% referente a impostos federais;
- 22,04% referente a impostos federais de importação;
- 12% sobre impostos estaduais.
Chegamos então a um total de carga tributária de 45,9%, ou R$12.527,72 — novamente, bem próximo ao valor destacado em nota pela Apple.
Como a cadeia produtiva da Apple Brasil, no que se refere a Macs, compreende basicamente importação e revenda para o consumidor final, é este último quem acaba por arcar de fato com essa carga tributária.
Por fim, vale lembrar que, por mais que a tabela leve em consideração os códigos dos produtos, não são computados ali aspectos como o regime tributário específico da empresa e possíveis imunidades, isenções, reduções, não incidências e aproveitamento de créditos tributários dos quais a empresa pode se valer por força de lei.
Ou seja, isso não representa o valor que a Apple recolhe aos cofres públicos e sim o valor que o consumidor final suporta ao longo de todo o processo, desde a fabricação até a venda do produto.
Espero ter ajudado a esclarecer um pouco mais as coisas. 😉